sábado, 10 de setembro de 2022

A praia

Hoje será, muito provavelmente, o nosso último dia de praia das férias. Escrevo esta frase melancolicamente enquanto imagino a despedida. Costas viradas para o areal longo, o mar bravo espalhando as suas gotículas de sal e os cabelos revoltos, despenteados da brisa salgada.

Despeço-me também do encanto que foi ver a praia através dos olhos dela. A felicidade das coisas simples: a piscina na maré vazia, as pazadas de areia, as sestas debaixo do chapéu enquanto o vento belisca o pano que o tapa.

sexta-feira, 19 de agosto de 2022

9

 9 meses dentro, 9 meses fora, tudo mudou no dia 19.

Há qualquer coisa de mágico neste número que teima em me aparecer. Qualquer coisa ímpar, auto-descritiva. 9.

9 que rima com chove, move, prove, 9 que rima contigo.

Tu que és o fim e o princípio, a mudança irreversível, um ser-se novo que já não se pode não ser. O mergulho mais profundo, o grande teste de paciência.

terça-feira, 24 de maio de 2022

Redenção

 No colo que te dou encontro redenção. 

Expio a culpa que sinto por ser mãe e humana, por não te conseguir abnegadamente amar a todos os momentos. Por cada vez que internamente expludo, farta de te ouvir chorar mais uma vez, cansada de não conseguir terminar uma tarefa do início ao fim, perdida de mim própria pela enésima vez, pego-te ao colo. 

Mesmo que contrariada, mesmo que em silêncio, entorpecida, ou em terramoto por dentro. Pego-te ao colo e tento, devagarinho regular-me a mim ao mesmo tempo que te regulo a ti. E assim ficamos juntas em circuito de regulação, no escuro, abraçadas uma à outra, numa dança tribal mamífera até encontrarmos a calma da qual ambas precisamos.

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

Last Hour

Há viagens que fazemos e nas quais não nos deslocamos. Viagens sem sair do lugar. Sonhos, livros e sons poderão levar-nos lá. Mas não é desse tipo de viagens que falo hoje. É um tipo de viagem mais transformadora pois dura 40 semanas. 10 meses de intensa descoberta de mim e da forma como me projecto no mundo. A amplitude de sentimentos inexplicável: a esperança, o desespero, uma espécie de abandono do eu ou o constante deslumbramento com a inata capacidade feminina de me transformar, de criar do zero, de uma forma quase automática, imparável.

À medida que a minha barriga expande, que as minhas ancas alargam e que as minhas mãos e pés crescem, viajo cada vez mais fundo até às profundezas daquilo no qual me vou tornar, daquilo do qual fugi e das coisas que tenho a certeza querer deixar para trás.

Por cada semana que o calendário leva, diminui o controlo, toma conta o deixar ir, a sensação de que apesar de já termos atravessado 3 estações juntas, a viagem está quase a acabar.

A casa tornou-se pequena para albergar esta viagem. Está na altura de avançar.




quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Everything is so clear when the snow is dancing

Eu tenho música em mim.
Mesmo podendo não parecer.
Por entre a neve a cair lentamente
ouço ao longe um piano a gemer
sem descanso.
E sei, imbuída de toda a paz interior
que somos um só.
Vibramos ao som das estações
que lá fora desfilam
sem autorização
com toda a naturalidade
sem forma de serem paradas
trocadas, saltadas.
E nem quando eu parei
quando chegou o tempo de me isolar
elas deixaram de avançar
ou o piano de tocar
pois o metrónomo não descansa
enquanto durar esta nossa dança.

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Just Like Water

 

 If only I could talk about the sea of people

that live in my head everyday.

The ones I loved

and how I loved them

so intensely, so fiercely, so out of control.

The ones I pretend to have left behind

still navigating in me

every time I forget to put my walls up

Or when I don't remember how to swim.





quarta-feira, 1 de julho de 2020

Variação Sobre Verão II



Pelos prados me imagino a correr para fugir ao caos que hoje me preenche.
Normalmente a cabeça não se importa de estar fechada, confinada, protegida. Não quer saber porque sonha, sonha, sonha, expande-se para além dos limites que lhe imponho.
Mas há dias em que a liberdade grita mais alto, em que o vento se sente com mais saudade e que o mar parece murmurar cada vez mais longe.
Há dia em que tudo o que achei ter construído se desmorona e baralha como peças de puzzle por acabar e encaro novamente a impostora que se esconde por trás do embrulho quase perfeito.